domingo, 3 de julho de 2022

EÓLICA - ESTUDO APONTA PROBLEMAS EM DUNAS E ÁGUA EM CAMOCIM

Reportagem de Carlos Madeiro (Colunista do UOL)

A instalação em grande escala de parques eólicos na região Nordeste se tornou motivo de preocupação para pesquisadores do tema, que dizem que o avanço do setor ao longo das últimas duas décadas ocorreu sem minimizar corretamente os danos ambientais. A coluna conversou com pesquisadores e leu estudos mais recentes, que revelam impactos como desmatamento e redução na movimentação de dunas e da recarga de lençóis freáticos (água subterrânea, essencial especialmente no semiárido).


A pesquisadora Raquel Morais, da UFC, fez uma análise sobre a qualidade das águas subterrâneas em Camocim, no extremo oeste do litoral cearense. No local, o parque eólico ocupou uma área de 1.040 hectares (o equivalente a 10,4 km²), e que 5% desse terreno foi impermeabilizado. No estudo ela perfurou 15 poços, que depois foram fechados e expostos a mudanças de solo similares às causadas pelos empreendimentos. O resultado obtido foi que os poços estavam com menos pressão e vazão de água. "As interferências são muito relevantes e influenciaram também a recarga das lagoas entre as dunas, muitas delas que eram permanentes antes da instalação do parque", diz.

Ela cita que, após a implementação do empreendimento, esses volumes hídricos secaram, comprometendo a pesca.

Um outro estudo na mesma área foi feito pela geógrafa Gloria Duran, especialista em sensoriamento remoto (ciência que estuda imagens captadas à distância). Ela usou imagens antigas e recentes de satélite para comparar os impactos das dunas de Camocim. "Existiam deslocamentos de até 100 metros a cada dois anos dessas dunas, e depois que foi construído houve uma redução e não supera 60 metros em alguns locais. 
A construção dos parques se transformou numa espécie de barreira sobre o campo de dunas", explica. Ela cita que, à época, o impacto conseguiu ser medido antes porque os parques de Aracati e Camocim foram as primeiras construções na região.

"Foi feito de forma muito rápida", completa.

O professor e pesquisador da UERN (Universidade do Estado do Rio Grande do Norte), Rodrigo Guimarães, também estuda o tema há anos e reforça que a instalação das fundações muda a dinâmica natural das dunas por conta dos aterros e estruturas de suporte às torres. "Além disso, a utilização de água subterrânea em grande quantidade diminuindo o aporte [de água] de ecossistemas, como lagoas costeiras e manguezais", diz. Sobre o movimento das dunas, Guimarães explica que boa parte delas migram naturalmente e voltam para o mar através dos estuários [área alagada de encontro com o mar] de rios. "Com as obras, as dunas são escavadas. Eles injetam muito concreto na base para instalar as torres, e as dunas vão sendo fixadas", completa.

A bióloga Paula Tavares, que é mestre em geografia pela UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), também pesquisou o impacto nos pássaros com as torres e cita que há danos encontrados. "Os principais são as colisões, os afugentamentos e o efeito de barreira", diz. Ela defende que o licenciamento ambiental deve analisar o local, onde o parque vai ser erguido para saber o impacto. Quando já erguido, existem formas também de reduzir impactos, como a pá pintada de preto na turbina —que consegue reduzir em até 70% a morte acidental de pássaros. 

"Uma outra tecnologia muito interessante é a instalação de radares que detectam a aproximação de bandos de aves e com essa informação as máquinas podem ser paradas, evitando a colisão", conta.


Por Tadeu Nogueira