domingo, 22 de junho de 2025

O DESBRAVADOR DO COSMOS

Por Avelar Santos*

Naquele domingo, cheio de sol e cores, após ir à missa matinal, na Igreja Matriz de Bom Jesus dos Navegantes, com a belíssima prédica de Frei Batista acerca do Sermão da Montanha ainda ecoando em minha mente, fui dar uma volta pela orla, indo até à Praia do Farol, acariciando, com o olhar, tanta beleza, que, silenciando o velho fusca, por instantes, fiz uma prece de agradecimento ao Criador por me permitir desfrutar daquele momento tão especial para mim.

Na volta deste breve passeio, com a alma mais leve que pluma de algodão, ao passar pelo El Mirador, eis que me deparo com o estimado amigo Pané, que morou, à mesma época que eu, no Núcleo dos Estudantes Camocinenses, situado à Rua Liberato Barroso, bem perto do Liceu do Ceará, na loira desposada pelo sol, em meados do século passado, onde aprendemos não somente muitos conhecimentos sólidos sobre o mundo, mas também vislumbramos, com toda a nossa alma juvenil, a forja maciça dos rigores de uma vida franciscana, repleta de provações, que aplainou o nosso caminhar, fazendo-nos fortes o suficiente para suplantarmos, no futuro, com estoicismo, as vicissitudes da existência que certamente nos dariam o ar de sua graça.

Tal não foi minha alegria ao vê-lo, depois de longo tempo, com aquele seu jeito bonachão, ao lado da sua família, desfrutando, merecidamente, das delícias dos frutos do mar de nossa abençoada terra, bebericando, tranquilo, guaraná.

Depois de percorrermos, sem pressa, o passado, eis que ele me pergunta se eu me lembrava do Tergal, o melhor ponta esquerda que já vira jogar, rivalizando, talvez, em termos de genialidade, com o Edu, do Santos de Pelé, no que prontamente respondi-lhe que fazia muitos anos que não o via mais.

Depois disto,o Panézinho, baixando um pouco a voz, num tom obsequioso, como se quisesse mesmo me alertar para algo de ruim que sucederia, em seguida, falou que o Tergal havia partido, recentemente, para as estrelas, tal como havia predito, para nós, na juventude, após uma noite de pura boemia, no Montese, acompanhado de duas beldades negras, dessas de arrasar dois quarteirões inteiros, com seu charme e sensualidade, que ajudaram-no, com maestria, na batida do pino do seu velho coração, fazendo-o partir muito feliz.

Vendo o meu estado de choque ao ouvir aquilo, porquanto nós três éramos amigos de primeira hora, como se diz, além de sabedor do meu descompasso, desde sempre, com a madame enfezada que empunha a foice e o martelo, o Pané, como bom conhecedor da psicologia humana, mudou logo de assunto, tentando desanuviar as nuvens escuras que pairavam sobre mim, trazendo à baila, com um sorriso no rosto, uma passagem, repleta de mistério, que acontecera, certa feita, com o Tergal, na subida da estrada de Maranguape.

Acontece que ele era apaixonado por Ufologia e adorava ler artigos de revista que versavam sobre esta temática, esgrimindo, aqui e ali, em rodas de conversa de botequim, o seu conhecimento profundo sobre o espaço sideral, abrindo os olhos de todos os circunstantes sobre a possibilidade real de existirem perdidas civilizações extraterrestres bem mais avançadas em termos de tecnologia do que a nossa, posto que seria deveras incompreensível, na sua aguçada ótica de intelectual, de homem da Ciência, que, na imensidão infinita do cosmos, o Onipotente não tivesse criado, também, vida em outros planetas.

Naquela noite distante, observado somente pelos astros, o Tergal, com o seu valente Corcel I, rompendo com os seus faróis a escuridão, subia devagar aquele trecho perigoso da serra, muito embora quisesse chegar o quanto antes em casa para um merecido descanso, depois de um dia cansativo de trabalho, na repartição, que ficava próxima ao CPOR, na Avenida Bezerra de Menezes.

De repente, ao sair de uma curva sinuosa, o Tergal viu descer do céu uma flecha de luz brilhante, vinda em sua direção, que incidiu diretamente sobre o veículo, que estacou. Transido de medo, ele desceu lentamente do carro, sem nada enxergar, visto que o sol parecia estar ali, diante dele, quando se viu repentinamente abduzido para o interior de uma nave espacial, onde seres de aparência bastante estranha estavam a manusear aparelhos, que lhe pareceram eletrônicos, mas que eram totalmente desconhecidos para ele.

Não se sabe ao certo nem o que houve, efetivamente, na espaçonave, nem tampouco o quanto durou este contato imediato de terceiro grau do Tergal.

Na manhã seguinte, um caminhoneiro, ao passar por ali, vê um pobre homem, bastante assustado, com as roupas rotas, de olhar perdido, pedindo socorro, à beira do caminho, parecendo estar muito desnorteado. Assim, tal qual o bom samaritano da bela parábola, leva-o diretamente para o Hospital mais próximo.

Depois disto, o Tergal não foi mais o mesmo!

E nunca mais ele falou sobre Ufologia!

*Professor e Escritor Camocinense