sábado, 5 de julho de 2025

SAUDADES DO FUTURO

Por Avelar Santos*

Sou de uma época jurássica, bem anterior a tudo que se imagina, quando o mundo vivenciava, aflito, dia após dia, nas mais diversas latitudes e longitudes, a guerra fria, os avanços e recuos militares intermináveis no embate estratégico de duas superpotências, Estados Unidos e União Soviética, cujo clímax aconteceu quando a inteligência americana descobriu que os soviéticos haviam instalado mísseis, em Cuba, o que levou à iminência de uma catástrofe nuclear que, para sorte de todos nós, evidentemente isto não aconteceu.

Agora, mais uma vez, passados cinquenta anos desse fato histórico, a humanidade vive novamente momentos de aflição, de medo, por conta do acirramento da tensão entre os Estados Unidos e a Coreia do Norte, cujo ditador, de nome tão esquisito quanto ele próprio, Kim Jong-un, um baixinho de olhos repuxados, com alguns parafusos soltos, resolveu desafiar as leis vigentes, que regem tal assunto, inclusive passando ao largo das admoestações do Conselho de Segurança da ONU, realizando testes quase que semanais com artefatos balísticos intercontinentais que, em tese, podem levar ogivas atômicas e causar uma destruição de proporções inimagináveis.

Na outra ponta da mesa, encontra-se o magnata Donald Trump, guindado recentemente à Presidência dos EUA, derrotando a candidata favorita nas pesquisas, Hillary Clinton, apoiada por Obama, cujas características centrais apareceram tão logo ascendeu ao poder (determinação e coragem), que já determinou o envio de submarinos e porta-aviões americanos para o Mar do Japão, área em que acontece este conflito, como meio de dissuadir o Presidente Norte-Coreano a tomar quaisquer atitudes mais intempestivas.

Não é preciso, portanto, ser nenhum Einstein para chegarmos à conclusão óbvia que estamos amarrados a um barril de pólvora, cujo estopim está prestes a ser aceso, com prejuízos incalculáveis para todo o globo, sendo o início do fim, configurando-se, assim, o temível Armagedom, desde que a ação da diplomacia dos países contendores não surta o efeito imediato tão esperado.

Ainda existe uma saída para esse bizarro e perigoso imbróglio. E isto é muito bom. 

Prova disso, é que, recentemente, uma autoridade coreana de alto escalão disse que o governo de Pyongyang pode ingressar em um diálogo produtivo com o governo de Washington se as condições forem corretas. 

Segundo esta fonte oficial, isto acontece em meio a um aumento dos esforços internacionais para pressionar o país comunista asiático a desistir de seus interesses beligerantes e, consequentemente, reduzir as tensões recentes que atingiram níveis alarmantes, de lado a lado, cujos tentáculos insidiosos se distendem, infelizmente, a outras nações, de ideologias várias, na aldeia global.

E eu que me aposentei faz pouco tempo, depois de uma eternidade no Magistério, na Terra da Luz, que pensava, aqui, com os meus pálidos botões, nos anos restantes da existência, sob a complacência das bênçãos celestiais, em cuidar de bichos e plantas, num pequeno sítio, adquirido com suor e lágrimas, na zona rural de minha amada Camocim, desfrutando da simplicidade prazerosa da vida do campo, ouvindo, fascinado, o canto mavioso dos passarinhos, nos cajueiros gigantes, ao redor da casa, revigorando o espírito alquebrado com louvações ao Criador, ao romper de cada aurora, rendendo-lhe franciscanamente graças por tudo, inclusive pelos percalços do caminho, que tanto me fortaleceram, ao longo da jornada, observar toda essa descomunal insensatez, traz-me uma insônia danada - e calafrios intermitentes.

Com mais de tempo livre, pensei em me dedicar a escrever sobre o Camocim de antigamente, que vivi com intensidade, época de ouro da mocidade que jamais esquecerei, trazendo a lume, aqui e ali, certos fatos que perpassaram o umbral da urbe, bem como outros, de cunho picaresco, que pontilharam os caminhos por mim percorridos, há mais de meio século, na Terra dos Tremembés, almejando, também, quem sabe um dia, enfeixar algumas singelas crônicas minhas em um livro, porquanto já escrevi centenas, o que ainda não o fiz por falta de apoio logístico dos órgãos governamentais que dizem tratar de cultura, ou quiçá, com uma pitada de sorte, de ser avistado por um Mecenas, posto que eu não disponho do vil metal para esta finalidade.

Enquanto a vaca teima em não voar e o boi ainda não pegou um resfriado forte para tossir, vou escavando a cacimba da memória, aqui e ali, retirando, deste poço profundo, dentre os pedregulhos de pouca utilidade, que servem somente para reforçarem sua base, algumas preciosidades de cenas que presenciei, antes que o cavalheiro do tempo queira apagá-las de todo da minha mente, na esperança, que alumia as trevas da escuridão, que minhas palavras não se percam pelos caminhos, e que possam ser ouvidas, mesmo que por poucos, quem sabe, embrulhadas em papel de presente, nos anos que virão.

Que o Todo Poderoso tenha piedade de nós, acalmando os ânimos inflados desses dois mandatários, e que restabeleça, na sua infinita misericórdia, para nossa alegria, o quanto antes, na Terra, o manto sagrado da paz universal.

Que saudades do futuro!

*Professor e Escritor Camocinense