DAS JANELAS QUEBRADAS
(Roberto Fernandes)
Sempre busquei compreender o fenômeno da
violência em relação à sua grande incidência na periferia das cidades. Jamais
aceitei a crítica de que violência é coisa de pobre, embora não tivesse
argumentos suficientes para refutar esse preconceito. Há algum tempo, porém,
cristalizou-se verdadeira minha suspeita inicial, depois que aprofundei o
conhecimento a respeito da chamada Teoria das Janelas Quebradas: violência não
tem nada a ver com ser pobre.
Essa doutrina comprovou cientificamente que a
violência está relacionada, na verdade, ao estado de degradação e abandono de
determinados ambientes. Baseada na teoria das vidraças quebradas,
estabelecera-se uma relação entre a desordem e a criminalidade, a partir da
seguinte experiência: Cientistas abandonaram dois carros idênticos em duas
regiões dos Estados Unidos, um numa zona pobre, marcada por conflitos e outro,
numa localidade rica, de alto padrão de qualidade de vida. Em pouco tempo, o
veículo deixado na zona pobre estava totalmente vandalizado. Enquanto isso, o
outro carro fora observado intacto! Ocorre que os pesquisadores quebraram uma
janela deste carro, e o resultado seguinte foi semelhante ao da comunidade
pobre – pouco a pouco, ele foi sendo totalmente saqueado.
E qual a conclusão que podemos tirar dessa experiência?
Que na verdade, o estado de abandono e degradação social proporcionado pela
falta de fiscalização e controle nas regiões mais pobres é a responsável pela
incidência da violência nestes locais. Se alguém quebra a janela de um carro e
não se conserta imediatamente e se alguém estaciona um veículo numa zona
proibida sem que haja punição, a tendência é que o comportamento evolua para
casos de violência mais graves.
A teoria das Janelas quebradas serviu de mote
para a adoção da operação Tolerância Zero, em Nova York, responsável pela queda
de 57% no número de crimes naquela cidade, que consistia no combate irrestrito
aos pequenos delitos, como forma de prevenir a ocorrência de crimes mais
violentos. Para se ter uma ideia, o metrô de Nova York era pouco utilizado,
devido à ação de vândalos no local. Mesmo depois dos resultados da Tolerância
Zero, as pessoas continuaram a não frequentar o local.
Foi só a partir da
conservação do metrô, quando limparam-lhe, pintaram-lhe e deram-no um trato
visual mais cuidadoso é que as pessoas passaram a frequentá-lo, e a
efetivamente sentirem os impactos da redução dos crimes. Portanto, embora já
tivessem reduzido a criminalidade, essa percepção só foi sentida quando os
cidadãos passaram a ver aquele local mais conservado – confirmando mais uma vez
o sentido da teoria das janelas quebradas.
Em Camocim, bem como em Fortaleza, a violência
deu saltos espantosos nos últimos anos. Em qualquer destas cidades é muito
comum os motociclistas conduzirem sem capacete na periferia. Quando não são
menores na direção, são pessoas embriagadas, ou três pessoas nesse transporte.
Sem falar no estacionamento irregular. Já na área central, tais condutas não
são tão comuns, pois a fiscalização é presente. Daí porque não é todo dia que
se vê uma vítima de homicídio em plena área bancária...sempre muito bem
protegida.
As autoridades camocinenses não podem ignorar
este importante estudo. Violência não é problema exclusivo de polícia. Esta tem
a maior parcela de responsabilidade na prevenção à criminalidade, mas sem
cooperação com a Sociedade e demais autoridades, suas iniciativas e esforços
fazem-se inócuos diante da dinâmica que estudamos. Cabe ao prefeito investir em
sua guarda municipal, utilizando-a de maneira racional e eficiente, aumentando sua
atribuição de fiscalização, dando-lhe uma missão e cobrar por resultados. O
legislativo tem obrigação de fiscalizar esse papel do gestor municipal, ao
mesmo tempo em que deve instituir novas ferramentas de controle sobre a conduta
social.
O Judiciário e o Ministério público precisam ouvir mais a polícia, se
envolver e mostrar compromisso em sua parcela de responsabilidade acerca da
Segurança Pública. A Sociedade deve se engajar, se organizar, principalmente no
sentido de pensar medidas de melhorar sua qualidade de vida, além de denunciar
os delitos, cooperando com as polícias. Enfim, às polícias, compete investir em
planejamento e no trabalho integrado das suas atividades preventivas e
repressivas, de polícia ostensiva e polícia investigativa, sobretudo no que
tange ao uso da informação, priorizando o combate ao tráfico como sua meta
principal.
A questão da violência deve ser tratada
muito mais do que a mera análise do números de homicídios, muito menos
delegando toda a responsabilidade ao aparato policial. Se quisermos tratar essa
doença, mais eficiente do que o foco nos sintomas é combatermos as suas causas.
Roberto Fernandes é Servidor Público e Graduando em Administração Pública pela Universidade Federal do Ceará.