Contam os mais velhos que existia em Camocim um comerciante que nos tempos em que os navios ancoravam no nosso porto, era acostumado comprar carregamentos inteiros de açúcar vindo de Pernambuco.
Feito o descarregamento em seu armazém, os trabalhadores tinham a missão de tirar de cada saco dois quilos do produto. Os sacos de 60 quilos se transformavam em 58, mas eram vendidos como se fossem aqueles. Portanto, o "esperto" comerciante a cada saco vendido subtraía dois quilos que iam parar em outros sacos aumentando seu estoque.
Aconteceu que numa compra mais avultada de toneladas, o fruto da reengenharia de peso do dito comerciante foi depositada num canto do armazém sem maiores reparos. Era mês de abril e caiu um pau d'água de três dias sem parar na cidade. Sem poder observar detidamente o armazém, as chuvas provocaram uma super goteira no dito que caía diretamente no açúcar amontoado.
Quando o tempo abriu, observou-se que corria um riachozinho de água doce, dia e noite, que ia do armazém até o mar. O açúcar se desmanchava em água de açúcar.
Diz-se até que vinha gente, principalmente mulheres e meninos dos mais distantes bairros e até da zona rural pegar água de açúcar, uns com baldes, outros com cabaças, cumbucas, cuias e outros recipientes.
O açúcar desceu todinho, e no fim do inverno só ficaram os sacos.
O comerciante via aquilo tudo desolado, pois ninguém comprava açúcar molhado. Para os que se aventuravam diariamente a colher aquela garapa, pelo menos servia para adoçar café ou outras utilidades que a necessidade pedia.
Pois é, quem diria que Camocim, uma terra banhada pelo Atlântico, cheia de lagos e lagoas, já correu um rio de açúcar!